Título: A alienação social causada pelo fanatismo
religioso
Autora: Andréa Cavalcante Monteiro Alves
Apócrifo: “O sofrimento religioso é, ao mesmo tempo,
expressão de um sofrimento real e um protesto contra o sofrimento real. Suspiro
da criatura oprimida, coração de um mundo sem coração, espírito de uma situação
sem espírito: a religião é o ópio do povo”. Karl Marx.
Resumo:
O presente artigo traz uma abordagem sobre o
fenômeno da alienação social causada pelo fanatismo religioso, uma vez que desde os tempos mais remotos, o homem sempre
precisou crer em algo superior,não só para suportar os sofrimentos e as
vicissitudes da vida, mas sobremaneira para concretizar sua evolução. Nesse
contexto,a fé é a saudável crença interior em algo que nos inspira, nos dá
força e nos ajuda a seguir em frente. Tanto a fé quanto as ideologias são,
portanto, sadias, quando racionais. Já o fanatismo é paixão, egoísmo e
manipulação dos semelhantes, porque este não passa de uma fé cega, irracional,
exacerbada, quase sempre caracterizada por discursos inflamados que não condizem
com a razão. Este trabalho tem por escopo refletir sobre a maneira como o
fanatismo religioso desequilibra e leva à insensatez, causando uma verdadeira
devastação na vida do fanático, bem como das pessoas que o rodeiam.
Palavras-chave:alienação, fanatismo, desequilíbrio,
insensatez, sofrimento.
Abstract
This paper presents an approach to the phenomenon of social alienation caused by religious fanaticism, since from the earliest times, man has always needed to believe in something higher,not only to endure the sufferings and vicissitudes of life, butgreatly to achieve its evolution. In this context, faith is the healthyinner belief in something that inspires us, gives us strength andhelps us move on. Both faith and ideologies are therefore healthy, when rational. Have fanaticism is passion, selfishness andmanipulation of similar, because this is just a blind faith, irrational,exaggerated, almost always characterized by inflammatory speeches that do not fit right. This work has the scope to reflect on how religious fanaticism unbalanced and leads to folly, causing a real havoc in the life of the fanatic, and the peoplearound you.
Keywords: alienation, bigotry, imbalance, folly, suffering.
Introdução:
De acordo com o dicionário, o
indivíduo considerado fanático é aquele que segue cegamente uma doutrina ou
partido, ou seja, o termo não está ligado unicamente a doutrinas políticas ou
religiosas, pois tudo aquilo que leva o indivíduo a extrapolar os limites da
racionalidade e que culminam no exagero são consideradas formas de fanatismo. Oriundo do latim, fanaticus, significa "o
que pertence a um templo, fanum”. O fanático coloca-se
na posição de escravo diante de uma autoridade que pode ser vista como uma
divindade, um líder, uma causa. O fanatismo é alimentado por uma fé irracional,
exacerbada, quase sempre caracterizada por discursos inflamados que não
condizem com a razão, assim como também pelas crenças absolutas nas quais seus
adeptos se esmeram e não medem esforços ou consequências para servir ao seu
senhor. O fanático acredita ser capaz de exorcizar pessoas e coisas, combater
as forças maléficas ou salvar a humanidade do caos.
O
fanático é dado aos extremismos, uma vez que para ele, os males do mundo
curam-se através de soluções radicais, tudo em nome da defesa dos seus ideais.
Muitos chegam ao ápice do extremismo quando praticam atos violentos, outros
simplesmente podem utilizar-se da exacerbação verbal, sempre motivado por uma
causa suprema.
Alguém pode ser considerado fanático
por amar em demasia outro ser, um objeto, time de futebol, etc., o erro mais
comum das pessoas é o de designar fanatismo como sendo algo relacionado
exclusivamente à política ou à religião, porém o nosso foco, como fora dito
anteriormente, será o fanatismo religioso. Muitas polêmicas surgem acerca desse
tema. Na maioria vezes o fanatismo pode fazer com que uma pessoa cometa atos
insanos em nome de um ideal, de um amor ou algo do gênero.
O fanático sofre discriminação por
apresentar um exagerado interesse em algo ou em alguém, portanto, todos
precisam ficar em alerta, uma vez que o fanatismo não se restringe a uma
determinada classe social, credo ou raça.
Oriundo
dos dogmas religiosos, reiteramos que o fanatismo não se limita a este campo,
uma vez que existe fanatismo relacionado às ideologias políticas e
revolucionárias, às raças, até mesmo relacionado a coisas banais, como um time
de futebol. Todos os exemplos supracitados são considerados formas de
fanatismo, principalmente quando extrapolam a dimensão racional, guiando-se
pela crença de foram os eleitos, os escolhidos pelas divindades cultuadas.
O
elemento que impulsiona o fanático é o caos. Ele é um indivíduo, por natureza,
mentalmente teimoso, assim como vedado a novos começos, sendo convicto de que
sua verdade é a única, portanto não se permite intervalos para indagações, onde
a mente está pronta para novas reações e novos começos.
Percebemos
estas características fortemente arraigadas dentre os fanáticos religiosos, e
estes usavam e ainda as usam, para justificar verdadeiras atrocidades cometidas
ao longo da história, culminando em tragédias coletivas, noticiadas no mundo todo,
a exemplo da "caça as bruxas" na idade média, da perseguição aos
negros, índios, comunistas, homossexuais, prostitutas, judeus, o
movimento da Jihad islâmica contra os "infiéis do ocidente" e a
"guerra aos terroristas". Todos estes exemplos nos mostram o quão
vivo e atuante em nossa época, supostamente civilizada, científica e
informatizada, perpetua-se o fanatismo.
1. Fanatismo:
uma abordagem psicológica
A primeira vista, o fanatismo parece
sustentar-se numa estrutura psicótica, uma vez que um indivíduo acredita ser o
detentor de uma certeza absoluta e intitula-se o escolhido por uma divindade
para cumprir determinada missão, já demonstra sintomas que justifiquem um diagnóstico
de loucura ou psicose. Conforme análise de Becker, segundo Freud, “aquilo que o
psicótico paranóico vivencia na própria pele, o parafrênico experiencia na pele
do outro”, ou seja, somos levados a supor que o fanatismo está mais para o
campo da parafrenia do que para o da paranoia.
Do
ponto de vista psiquiátrico, toda forma de fanatismo parece estar relacionada à
fuga da realidade. A crença irracional é confundida com loucura quando se
manifesta em momentos ou situações específicas, porém o fanático aparenta ser
uma pessoa normal se sua inteligência não está afetada. No entanto, torna-se um
ser potencialmente explosivo, sobretudo se o fanatismo se combinar com uma
inteligência tecnologicamente preparada. O terrorismo, por exemplo, que atua
com a única meta de destruir inimigos aleatórios, é realizado por indivíduos
fanáticos cuja inteligência é instrumentada apenas para essa finalidade. Para o
terrorismo sustentado no fanatismo, os inocentes devem pagar pelos inimigos; a
destruição deve ser a única linguagem possível e a construção de um novo
projeto político-econômico, não está em questão.
Um exemplo clássico de como o fanatismo pode evoluir para uma distúrbio
mental é o caso de Hitler, antes considerado um paranóico, hoje é mais aceito
como parafrênico, por causa da sua fixação pela ideia de criar uma raça
superior a todas as outras raças, ou seja, a raça ariana e ainda a aniquilação
dos indivíduos considerados seres impuros.
A
denominação “raça ariana” foi utilizada pela primeira vez pelo diplomata e
escritor francês conde Arthur de Gobineu (1806-1882), de acordo com o escritor,
baseado na teoria de Friedrich Von Schlegel, existia um povo, os arianos, que
originaram-se na Ásia Central, migrando para o sul e para o oeste, chegando à Europa
e a alguns territórios onde hoje estão o Afeganistão, a Índia e o Irã. Essa
raça seria uma das três grandes raças humanas composta por pessoas brancas ou caucasianas. O vocábulo “ariana” deriva do sânscrito e
significa "nobre". O termo “raça ariana” teve seu auge no século XIX
até a metade do século XX e foi deveras utilizado pelo Partido Nazista da
Alemanha. Adolf Hitler retomou este conceito proposto por Gobineu para
justificar sua política de extermínio dos Judeus e povos não-arianos. O ápice
do extermínio foi durante a Segunda Guerra Mundial, onde médicos e cientistas
nazistas chegaram a tirar medidas de alemães e macacos para comparar com outras
“raças” humanas e mostrar para a população alemã que a raça ariana era
realmente superior, pois tinham menos semelhanças com os primatas do que as
demais raças. Segundo cientistas atuais, esta superioridade da raça ariana,
defendida pelos alemães, não é verdadeira e como fora antes mencionado, apenas
foi utilizada para justificar as medidas de extermínio utilizadas pelos
nazistas, o que comprova o mal que o fanatismo pode causar através de atos
insanos e violentos, pois os fanáticos nazistas, como pode ser observado,
através do que fora supracitado, não demonstravam nenhum respeito pela vida
humana.
Retomando nossa abordagem sobre fanáticos paranoicos e parafrênicos, se
faz necessário esclarecer que os indivíduos diagnosticados como paranoicos
alcançam o gozo psíquico ao serem olhados ou perseguidos, já parafrênicos, a
exemplo de Hitler, chegam ao ápice da sensação denominada gozo psíquico,
através de ações inteligentes que
culminam na perseguição e extermínio de milhares de vidas humanas, donde
extrai um quantum de
gozo sádico. Hitler, fanático e
parafrênico, usou toda sua inteligência para tentar dizimar os judeus, porém,
antes desta atitude ser julgada como um ato criminoso era uma exigência interna
de seu próprio psiquismo, uma vez que para o fanático, seus atos não são
considerados, dentro de suas crenças ideológicas, políticas ou religiosas como
atos terroristas ou de violência gratuita. Eles realmente acreditam que seus
atos são atos de amor, pois eles tentam salvar a humanidade, uma vez quecreem
que forameleitos por uma divindade superior, cuja missão na terra é salvar esta
humanidade fadada a condenação e a mercê do mal, não importando o que tenham
que fazer para que tal determinação se cumpra.
Certamente existem muitos gruposformados por fanáticos paranoicos pelo
mundo, no entanto o pior tipo de fanático é o fanático parafrênico, pois visa
de fato destruir em atos calculados "os impuros", "os
infiéis", enfim, todos os que não concordam com ele.
Na parafrenia, a compulsão de observar e atuar o ser do outro, alimenta
seu delírio interno. O parafrênico "faz acting out em nome de..." e
jamais assume seu ato criminoso, pondo a responsabilidade em alguém que para
ele encarna o "mal". Para sua "lógica", as vítimas são os
únicos responsáveis. É curioso observar que ontem os judeus se agarravam ao sacrifício do holocausto como modo de explicação
da tragédia em que eram vítimas, mas hoje a ultra direita israelense, no poder,
parece resgatar dos nazistas essa terrível ideia da "solução final"
contra os palestinos.
Durante
o Julgamento de Nuremberg, Goering, o braço direito de Hitler, afirmou que
cumprira ordens e não admitia ser um criminoso, nem se considerava culpado ou
com remorsos pelo extermínio. Ele atribuía a culpa pelo genocídio aos
próprios judeus e não aos seus carrascos nazistas. Os israelenses da "era
Sharon" também não se responsabilizam pelos atos criminosos de Israel
contra os palestinos generalizados como terroristas.
Se
no fanatismo o sujeito inexiste para ceder lugar a um ser superior, considerado
autoridade máxima ou até mesmo divindade, então faz sentido não assumir a responsabilidade
de seus atos criminosos, intolerantes, preconceituosos, hediondos, porque todos
esses atos são, para eles, justificáveis, uma vez que estes são vistos como obras do Senhor, ou seja, são
ações consequentes da eleição divina onde o sujeito é nadificado para
dar lugar ao discurso delirante da salvação messiânica .
O mundo do qual o
fanático faz parte foi dividido entre os eleitos e os que continuam nas trevas,
os quais precisam ser salvos ou serem combatidos por todos a qualquer custo,
pois representam as temidas forças do mal.
2. Religião , Fanatismo e Alienação social
De acordo com Walmor Piccinini,no Brasil é comum, haver uma mistura
da religiosidade e da psicopatologia, tornando-se difícil estabelecer os
limites entre uma e outra, onde termina a doença e começa a religiosidade, e
vice-versa.
Todos os movimentos de massa,
principalmente os religiosos geram em seus adeptos a disposição para morrer em
nome da causa, à qual defendem, assim como a tendência para a ação unida, ou seja,
todos, independente da doutrina que pregam, alimentam o fanatismo e alienam
socialmente os seus partícipes. Todos eles deflagram um poderoso fluxo de
atividades em certos setores da vida e exigem uma fé cega e uma submissão
total.
Curiosamente, a história das
religiões, sobre tudo as que são de origem cristã, se impuseram pela força, ou
seja, a história das religiões está marcada por violência e guerras. Pode-se
afirmar, inclusive, que a maioria dos conflitos contemporâneos têm sido tomados
como resultado de confrontos religiosos. Contudo, esses conflitos têm causas
bem mais complexas, que envolvem questões políticas, econômicas, sociais,
raciais e culturais e não somente o propósito religioso, como se propaga.
Como exemplo do que
fora supracitado, pode-se recordar da instauração dos tribunais da santa
inquisição, na idade média, pela igreja católica. Tal fato
ocorreu durante os séculos XV e XVI, mais
precisamente entre os anos de 1450 e 1750, quando a ideia teocentrismo cede
lugar ao antropocentrismo, gerando assim um certo desequilíbrio e a dispersão das
funções e poderes da Igreja, que com o intuito de resgatar o seu poder, instaurou estes tribunais, dando início ao
período de horror, que ficou conhecido nos livros de história como “Caça às
bruxas”. Acredita-se que cerca de trinta e cinco mil a sessenta mil pessoas
foram incriminadas, julgadas e condenadas à morte, sendo a maioria do sexo feminino,
abrangendo, inclusive, crianças.
As culturas pagãs, ou seja, todas
aquelas contrárias ao cristianismo ou ao judaísmo tornaram-se um prenúncio de
coisas más.A partir do ano 1320 a Igreja afirmou oficialmente que a bruxaria e
a religião pagã significavam uma ameaça, ou seja, uma séria intimidação ao Cristianismo. Assim, principiava-se, pouco a
pouco, o acossamento aos ímpios.A caça as bruxas ocorreu simultaneamente a
grandes mudanças sociais que estavam acontecendo na Europa, que foi arrasada
nesta época por várias guerras, cruzadas, pragas e revoltas dos camponeses.
Havia uma busca incessante pelos culpados por esse quadro. Verdadeiras
atrocidades foram cometidas em nome de uma religião. Seus seguidores fanáticos
torturam e mataram milhares de inocentes. Esse período negro da história
comprova o quão mal e alienante é o fanatismo religioso.
Das cruzadas aos conflitos muçulmanos
no Oriente Médio e na África, a violência foi uma constante no encontro entre
religiões, é aí que se mostra a face sombria da religião, representada pela
violência, insensatez e a fé cega e irracional dos fanáticos que as seguem e
que mantém os fiéis alienados.
Segundo Karl Marx “a religião é o ópio
do povo”, estas palavras nos mostram o quão alucinógeno e entorpecente é o poder
da religião sobre aqueles que sofrem, pois uma vez fragilizados, estão ávidos
por aplacar a dor e o sofrimento, dessa forma, as palavras dos seus guias
espirituais agem como bálsamo para esta dor, a qual se veem impotentes para
curar. Ainda de acordo com Marx, a religião só existe numa sociedade marcada
pela alienação e uma vez desaparecida essa alienação, numa sociedade livre em
que não haja opressores, ou seja, onde não exista alguém que ostente qualquer
sinal de superioridade hierárquica, desaparecerá também a religião, pois para
Marx a religião é fruto da alienação.
As palavras de Marx, apesar de
demonstrarem um tão radical, possuem uma certa razão se considerarmos que
alienação social e consequentemente o fanatismo, sempre acompanharam as
religiões diversas ao longo da história da humanidade. Contudo é pertinente
lembrar que os homens é que fazem as religiões e não as religiões que fazem os
homens. O problema real não está na religião, na fé, nas crenças, mas nos
homens que as conduzem, interpretam e as impõem aos seus seguidores, muitas
vezes aproveitando-se deste para obter algum benefício em detrimento dos seus
comandados crédulos e alienados.
O fanatismo religioso ocasiona a
separação entre os diversos segmentos e isso torna-se o principal gerador de
conflitos e intolerância entre os grupos, levando – os a cometer até crimes religiosos. Neste contexto
vemos que as religiões que possuem uma ala fundamentalista, são sempre as mais
atuantes. Cristãos, judeus, muçulmanos, hindus, sempre consideram seus inimigos
aqueles que professam uma fé diferente e, portanto, este motivo é o bastante
para justificar violência e guerras.
Conforme um estudo realizado pelo
Centro de Recursos da Paz de Santa Bárbara, na Califórnia (EUA), das 32 guerras
em curso ao redor do globo, em 1988, 25 delas tinham uma significativa dimensão
étnica, racial ou religiosa.
Infelizmente, quando uma religião é a
força governante de uma sociedade, o fanatismo oriundo dela produz horror.
Quanto mais fortes as crenças sobrenaturais, pior a desumanidade. Uma cultura dominada pela fé fanática e
irracional torna-se cruel com as pessoas que não comungam com sua doutrina.Portanto,
reiteramos e ratificamos o que já fora explicitado anteriormente,o grande
problema não está nas religiões ou na fé, o problema está no fanatismo que as
acompanham.
3. Características do fanatismo
O psicólogo
francês, J-M. Abgrael resume o método de doutrinação fanática
em três etapas:
I.
Sedução
das pessoas;
II.
Destruição
da antiga personalidade, eliminação dos elos familiares, sociais e
profissionais;
III.
Construção
de uma nova personalidade, de acordo com o modelo e às regras da seita.
O
fanatismo está geralmente ligado ao dogmatismo, isto é, à crença numa
verdade ou num sistema de verdades que, uma vez aceitas, não devem mais ser postas
em discussão e rejeitam a discussão com outros, portanto se está convicto de
que a sua é a única verdade aceitável, se não se está disponível a ouvir a
opinião do outro, se quer impor ao outro os seus ideais ou se considera o outro
um inimigo, um adversário pelo simples fato de que o outro não concorda com a
ideologia defendida pelo seu grupo, certamente você está apresentando sintomas
de fanatismo.
O fanático costuma
isolar-se da convivência familiar e social e adotam um modo de vida narcísico,
no modo padronizado de vestir, usar o cabelo, na linguagem utilizada, atitudes
em geral, até nos slogans que repetem incessantemente e punem aqueles que
desobedecem ou se recusam a obedecer estas regras impostas. Tudo isso é feito
para que ele sinta-se parte integrante de um grupo, aos quais ele denomina
“irmãos”. O indivíduo passa a sentir-se especial, apto a realizar a “missão”. Pessoas solitárias, que sofreram
grandes perdas, desilusões ou que passam por grandes problemas são mais
suscetíveis ao chamado de seitas fanáticas ou apresentam maior facilidade a
tornar-se um fanático religioso, quando seduzido pelas promessas de salvação e
resolução de todos os problemas, pois estas fazem parte das
estratégias utilizadas pelas seitas para arrebanhar novos fieis, estas
inclusive investem muito em programas produzidos para solitários que sofrem
insônia e depressão nas madrugadas. Os desesperados sentem-se atraídos pela
ilusão deuma nova vida, cheia de felicidade e facilidades.
No parágrafo anterior,
fora dito que os solitários são mais suscetíveis à conversão e, por
conseguinte, ao fanatismo. Essa afirmação é reiterada, ao observarmos que a
frustração, a desilusão, a solidão por si mesmas, sem qualquer estímulo de
proselitismo exterior, pode gerar a maioria das características peculiares do
crente convicto e consequentemente do crente fanático, lembrando que o sentido
de crente, aqui usado, é o denotativo, real, aquele que crê em algo, uma vez
que não nos referimos a uma religião em específico. Também percebemos que uma
técnica eficaz de conversão consiste basicamente em inculcar e fixar tendências
e reações próprias da mente frustrada. Um movimento proselitizador
deliberadamente inculca em seus adeptos um estado de espírito frustrado, isso
servirá aos interesses dos seus líderes, uma vez que dessa forma torna-se mais
fácil manipulá-los, pois todos estão ávidos por aceitação, por salvação, pelo
fim das dores e frustrações.
O
fanático quer impor a todos de modo tirânico a sua verdade, que é considerada
única e é extraída de sua inspiração ou crença absoluta. Outras características
do fanático são a intolerância, o preconceito e o egoísmo. Sobretudo acredita
ser um instrumento divino, eleito por Deus para corrigir a humanidade,
livrando-a dos impuros e infiéis. Ele não se julga culpado por suas ações, uma
vez que age a favor do divino. Todos os seus atos são atos de amor. Sua
obediência é cega. Transforma-se num ser subserviente que não ousa discordar
das ordens dos seus superiores, mestres espirituais, ensinamentos, mesmo que
estes prejudiquem seu semelhante.
Todos
que não comungam com suas ideias estão fadados à condenação, uma vez que servem
ao mal. São pessoas que merecem cuidados e atenção, pois são capazes de
verdadeiras insanidades que podem prejudica-los e a outras pessoas inocentes.
O
fanatismo religioso nos levaao sectarismo,
consequentemente perdemos nossa liberdade de consciência, pretendendo uma
liberdade dirigida, no que diz respeito ao pensamento e isso transforma o homem,
antes livre, em um sujeito servil, escravo de postulados que lhe proíbem a
expansão da alma pela ideia e pela razão.
O fanático é a antítese
do herói e do entusiasta. Enquanto o herói e o
entusiasta lutam por uma causa justa, o fanático, como já fora dito, torna-se
intolerante às ideias alheias. O herói e o entusiasta podem até morrer pela
causa que defendem, mas jamais o fazem em nome do proselitismo, violentando a
liberdade do outro, sobrepujando-o ou submetendo-o à sua vontade. Já o fanático
utiliza-se de meios violentos e cruéis para consegui-los, uma vez que ele
coloca uma causa suprema, justa ou delirante, acima da vida dele e dos outros.
Embora existam diferenças
evidentes entre os fanáticos sejam eles cristãos, maometanos, nacionalistas,
comunistas, nazistas, ou de qualquer outro segmento, o fato é que o fanatismo
que os anima, pode ser tratado como um só. O mesmo pode ser dito em relação à
força que os impulsiona para a expansão do domínio do mundo. Há uniformidade em
todos os tipos de dedicação, fé, conquista do poder, união e auto-sacrifício,
apesar do conteúdo das causas, bem como as doutrinas sagradas serem diferentes
e até divergentes, há certa uniformidade,nos fatores que as tornam efetivas.
Por mais que sejam diferentes essas causas sagradas pelas quais os homens são
capazes de dar cabo a própria vida, todos morrem basicamente pelas mesmas
coisas, ou seja, a salvação da humanidade.
O fanático está em toda
parte, sempre em ação, quer seja convertendo, antagonizando, vai tentando
moldar o mundo à sua própria imagem e quer estejamos a seu favor ou contra ele,
é crucial sabermos suas características e potencialidades, para que possamos
fugir ou não nos transformarmos em um.
4. Prevenção contra o fanatismo
O fanático
é uma espécie de idólatra, pois vive exclusivamente para cultuar algo dito
supremo, divino e quem adere a esse tipo de prática, exerce a idolatria – um
círculo ilusório, que conduz sempre ao mesmo ponto. Os fanáticos têm medo da
incerteza, e por isso são determinados e rígidos, focados numa ideia, a qual
não permite ponderações, dúvidas, sempre em uma única direção, como se
estivessem caminhando numa via de mão única. Tudo começa com a necessidade de
viver a vida através de outra pessoa, ou seja, a essência do fanatismo está no
desejo de fazer as outras pessoas mudarem é que, de preferência, comunguem com
seus ideais, sua doutrina, seu modo de viver, pensar e agir. Agir e pensar de
acordo com a sua vontade, indo contra ao que lhes é imposto pela seita que
seguem é, para o fanático, algo inimaginável, pois isso soa à indisciplina e
individualismo. A pessoa que não se deixa envolver, condicionar é considerado
desprezível. O fanático é o que renunciou à crítica, porque aceitou
integralmente um processo que se desenvolve a revelia do seu discernimento.
Conhecendo
as características de um fanático, a melhor estratégia é manter-se lúcido e não
perder o senso crítico, a capacidade de diferir o certo e o errado. Ponderar
sempre as decisões tomadas, principalmente àquelas que envolvem terceiros.
É
imprescindível colocar-se no lugar do outro e entender que não é necessário
concordar com aquilo que não está de acordo com suas crenças e ideologias,
contudo é um dever respeitar a escolha do outro, enquanto cidadão brasileiro,
já que vivemos num estado laico e, portanto, temos o direito de livre escolha
de crenças e credos.
Coagir,
violentar o direito do outro, excluir, agredir, todas estas ações são crimes
passíveis de punição. Agir com tolerância, sem esquecer que somos seres
pensantes e que esta característica nos difere das demais espécies de animais,
deveria refrear qualquer ação que pudesse prejudicar nossos semelhantes.
A ignorância e a falta de criticidade
impulsionam e fortalecem o fundamentalismo religioso. A cada dia as pessoas
estão ficando robotizadas, insensíveis a dor alheia, têm medo de pensar por si
mesmas e assim se permitem envolver doutrinas que corroboram o fanatismo.
Tomar consciência das escolhas feitas
e dos atos praticados faz-se urgente, assim como também é imprescindível buscar
o equilíbrio, pois é propício lembrar que todo excesso é prejudicial.
5. Conclusões
Por fim, o fanatismo pode ser
algo extremamente contagioso. A linha que o separa da fé é muito tênue. Seguir
uma religião, alimentar a fé em algo é saudável e benéfico aos seres humanos,
afinal desde os primórdios, o homem já cultivava crenças e praticava seus rituais
religiosos. O problema está nos excessos. Por essa razão é necessária uma boa
educação, informação, manter a mente aberta, pois se não é possível erradicar
este mal que assola o mundo, precisamos, no mínimo, combatê-lo fervorosamente.
Ninguém está imune a esse tipo de sentimento, é muito fácil, durante um período
de fragilidade emocional, sermos seduzidos por alguma doutrina que nos prometa
salvação ou resolução para nossos infortúnios, nossas desventuras. Também não
objetivamos que a leitura deste trabalho os levem para o outro extremo e assim
os leitores deste sejam transformarmos em fanáticos antifanáticos, radicais
antifundamentalistas, afinal, temos a consciência de que não é possível
derrotar o fanatismo, contudo podemos contê-lo, fomentando o respeito pela
diversidade, a criticidade e o bom senso.
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