Sonetos
Um soneto
é um tipo de poema de origem italiana, composto por 14 versos, geralmente
divididos em 4 estrofes – as duas primeiras com 4 versos cada, e as duas
últimas com 3 versos cada. Saboreie a poesia, aprendendo a apreciar, inclusive,
o gosto amargo de seus versos fúnebres, mórbidos, viscerais, esplâncnicos (que se refere às vísceras) e verminais.
Versos íntimos
Vês!
Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a ingratidão – esta pantera –
Foi tua companheira inseparável!
Enterro de tua última quimera.
Somente a ingratidão – esta pantera –
Foi tua companheira inseparável!
Acostuma-te
à lama que te espera!
O homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.
O homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.
Toma um
fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se a
alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!
.Psicologia de um vencido
Eu, filho
do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênesis da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênesis da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.
Profundíssimamente
hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância…
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.
Este ambiente me causa repugnância…
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.
Já o
verme — este operário das ruínas —
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,
Anda a
espreitar meus olhos para roê-los,
E há-de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!
E há-de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!
A
um monstro
Fome! E,
na ânsia voraz que, ávida, aumenta,
Receando outras mandíbulas a esbangem,
Os dentes antropófagos que rangem,
Antes da refeição sanguinolenta!
Receando outras mandíbulas a esbangem,
Os dentes antropófagos que rangem,
Antes da refeição sanguinolenta!
Amor! E a
satiríasis sedenta,
Rugindo, enquanto as almas se confrangem,
Todas as danações sexuais que abrangem
A apolínica besta famulenta!
Rugindo, enquanto as almas se confrangem,
Todas as danações sexuais que abrangem
A apolínica besta famulenta!
Ambos
assim, tragando a ambiência vasta,
No desembestamento que os arrasta,
Superexcitadíssimos, os dois
No desembestamento que os arrasta,
Superexcitadíssimos, os dois
Representam,
no ardor dos seus assomos
A alegoria do que outrora fomos
E a imagem bronca do que inda hoje sois!
A alegoria do que outrora fomos
E a imagem bronca do que inda hoje sois!
Ao
meu primeiro filho
(nascido
morto com 7 meses incompletos, no dia 02 de fevereiro de 1911)
Agregado
infeliz de sangue e cal,
Fruto rubro de carne agonizante,
Filho da grande força fecundante
De minha brônzea trama neuronial
Fruto rubro de carne agonizante,
Filho da grande força fecundante
De minha brônzea trama neuronial
Que poder
embriológico fatal
Destruiu, com a sinergia de um gigante,
A tua morfogênese de infante,
A minha morfogênese ancestral?!
Destruiu, com a sinergia de um gigante,
A tua morfogênese de infante,
A minha morfogênese ancestral?!
Porção de
minha plásmica substância,
Em que lugar irás passar a infância,
Tragicamente anônimo, a feder?!…
Em que lugar irás passar a infância,
Tragicamente anônimo, a feder?!…
Ah!
Possas tu dormir feto esquecido,
Panteisticamente dissolvido
Na noumenalidade do NÃO SER!
Panteisticamente dissolvido
Na noumenalidade do NÃO SER!
O
morcego
Meia
noite. Ao meu quarto me recolho.
Meu Deus! E este morcego! E, agora, vêde:
Na bruta ardência orgânica da sede,
Morde-me a goela ígneo e escaldante molho.
Meu Deus! E este morcego! E, agora, vêde:
Na bruta ardência orgânica da sede,
Morde-me a goela ígneo e escaldante molho.
“Vou
mandar levantar outra parede…”
— Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho
E olho o tecto. E vejo-o ainda, igual a um olho,
Circularmente sobre a minha rede!
— Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho
E olho o tecto. E vejo-o ainda, igual a um olho,
Circularmente sobre a minha rede!
Pego de
um pau. Esforços faço. Chego
A tocá-lo. Minh’alma se concentra.
Que ventre produziu tão feio parto?!
A tocá-lo. Minh’alma se concentra.
Que ventre produziu tão feio parto?!
A
Consciência Humana é este morcego!
Por mais que a gente faça, à noite, ele entra
Imperceptivelmente em nosso quarto!
Por mais que a gente faça, à noite, ele entra
Imperceptivelmente em nosso quarto!
O
meu nirvana
No
alheamento da obscura forma humana,
De que, pensando, me desencarcero,
Foi que eu, num grito de emoção, sincero
Encontrei, afinal, o meu Nirvana!
De que, pensando, me desencarcero,
Foi que eu, num grito de emoção, sincero
Encontrei, afinal, o meu Nirvana!
Nessa
manumissão schopenhauereana,
Onde a Vida do humano aspecto fero
Se desarraiga, eu, feito força, impero
Na imanência da Ideia Soberana!
Onde a Vida do humano aspecto fero
Se desarraiga, eu, feito força, impero
Na imanência da Ideia Soberana!
Destruída
a sensação que oriunda fora
Do tacto — ínfima antena aferidora
Destas tegumentárias mãos plebeias —
Do tacto — ínfima antena aferidora
Destas tegumentárias mãos plebeias —
Gozo o
prazer, que os anos não carcomem,
De haver trocado a minha forma de homem
Pela imortalidade das Ideias!
De haver trocado a minha forma de homem
Pela imortalidade das Ideias!
A
ideia
De onde
ela vem?! De que matéria bruta
Vem essa luz que sobre as nebulosas
Cai de incógnitas criptas misteriosas
Como as estalactites duma gruta?!
Vem essa luz que sobre as nebulosas
Cai de incógnitas criptas misteriosas
Como as estalactites duma gruta?!
Vem da
psicogenética e alta luta
Do feixe de moléculas nervosas,
Que, em desintegrações maravilhosas,
Delibera, e depois, quer e executa!
Do feixe de moléculas nervosas,
Que, em desintegrações maravilhosas,
Delibera, e depois, quer e executa!
Vem do
encéfalo absconso que a constringe,
Chega em seguida às cordas do laringe,
Tísica, tênue, mínima, raquítica …
Chega em seguida às cordas do laringe,
Tísica, tênue, mínima, raquítica …
Quebra a
força centrípeta que a amarra,
Mas, de repente, e quase morta, esbarra
No mulambo da língua paralítica.
Mas, de repente, e quase morta, esbarra
No mulambo da língua paralítica.
Idealismo
Falas de
amor, e eu ouço tudo e calo
O amor na Humanidade é uma mentira.
E é por isto que na minha lira
De amores fúteis poucas vezes falo.
O amor na Humanidade é uma mentira.
E é por isto que na minha lira
De amores fúteis poucas vezes falo.
O amor! Quando
virei por fim a amá-lo?!
Quando, se o amor que a Humanidade inspira
É o amor do sibarita e da hetaíra,
Quando, se o amor que a Humanidade inspira
É o amor do sibarita e da hetaíra,
De Messalina e de Sardanapalo?
Pois é
mister que, para o amor sagrado,
O mundo fique imaterializado
— Alavanca desviada do seu fulcro —
O mundo fique imaterializado
— Alavanca desviada do seu fulcro —
E haja só
amizade verdadeira
Duma caveira para outra caveira,
Do meu sepulcro para o teu sepulcro?!
Duma caveira para outra caveira,
Do meu sepulcro para o teu sepulcro?!
Agonia
de um filósofo
Consulto
o Phtah-Hotep. Leio o obsoleto
Rig-Veda. E, ante obras tais, me não consolo.
O Inconsciente me assombra e eu nêle tolo
Com a eólica fúria do harmatã inquieto!
Rig-Veda. E, ante obras tais, me não consolo.
O Inconsciente me assombra e eu nêle tolo
Com a eólica fúria do harmatã inquieto!
Assisto
agora à morte de um inseto!
Ah! todos os fenômenos do solo
Parecem realizar de pólo a pólo
O ideal de Anaximandro de Mileto!
Ah! todos os fenômenos do solo
Parecem realizar de pólo a pólo
O ideal de Anaximandro de Mileto!
No
hierático areópago heterogêneo
Das idéas, percorro como um gênio
Desde a alma de Haeckel à alma cenobial!
Das idéas, percorro como um gênio
Desde a alma de Haeckel à alma cenobial!
Rasgo dos
mundos o velário espesso;
E em tudo, igual a Goethe, reconheço
O império da substância universal!
E em tudo, igual a Goethe, reconheço
O império da substância universal!
Augusto dos Anjos
Augusto
de Carvalho Rodrigues dos Anjos nasceu em 28 de abril de 1884, no Engenho do
Pau d’Arco (PB).
Seus
pais eram proprietários de engenhos, os quais seriam perdidos alguns anos mais
tarde, em razão do fim da monarquia, da abolição e da implantação da república.
Foi
educado pelo próprio pai até ao período antecedente à faculdade. Formou-se em
Direito no Recife, contudo, nunca exerceu a profissão. Criado envolto aos
livros da biblioteca do pai,era dedicado às letras desde muito cedo. Ainda
adolescente, o poeta publicava poesias para o jornal “O Comércio”, as quais
causavam muita polêmica, por causa dos poemas era tido como louco para alguns e
era elogiado por outros. Na Paraíba, foi chamado de “Doutor Tristeza” por causa
de suas temáticas poéticas.
Augusto
dos Anjos vivenciou a época do parnasianismo e simbolismo e das influências
destas escolas literárias através de seus escritores, como: Olavo Bilac,
Alberto de Oliveira, Cruz e Souza, Graça Aranha, dentre outros. Porém, o único
livro do escritor, intitulado “Eu”, trouxe inovação no modo de escrever, com
ideias modernas, termos científicos e temáticas influenciadas por sua
multiplicidade intelectual. Pela divergência dos assuntos tratados pelo autor
em seus poemas em relação aos dos autores da época, Augusto dos Anjos se encaixa
na fase de transição para o modernismo, chamada de pré-modernismo.
O
poeta tinha como tema uma profunda obsessão pela morte e teve como base a idéia
de negação da vida material e um estranho interesse pela decomposição do corpo
e do papel do verme nesta questão. Por este motivo foi conhecido também como o
“Poeta da morte”. Sua única obra marca a
literatura brasileira pela linguagem e temática diferenciadas.
Haicai
1.
forma
de poesia japonesa surgida no século XVI e ainda hoje em voga, composta de três
versos, com cinco, sete e cinco sílabas. Costuma abordar temas que se referem a
elementos relacionados à natureza ou ao cotidiano.
o forma poética de
métrica e acentuação adaptada a partir desta, criada no Brasil. Origem: jap. haikai
Você pode crer
O pior cego
É o que quer ver
Millôr Frenandes
Poemas visuais ou cinéticos
A
poesia é uma forma de expressar sentimentos diversos em diferentes situações e
por isso mesmo pode ter inúmeras formas de ser apresentado. Dentre os gêneros
de poemas que podem existir está o poema visual ou cinético que consiste em poemas
que buscam trazer velocidade para que as palavras representem uma ideia mais
concreta.
Os
poemas visuais são compostos por elementos visuais ou gráficos organizados
artisticamente para expressar algum tipo de mensagem. Emprega as palavras dando
um novo sentido à poesia. A palavra aparece como um objeto que trabalha de
forma integrada o som, a visualidade e o sentido, propondo novos modos de fazer
poesia.
Imagem retirada do Google
Nenhum comentário:
Postar um comentário